O velho andarilho sente o cansaço em suas pernas.
Seus pés calejados já não resistem ao peso de cada
passo.
A dor é imensa, pés, pernas, joelhos
Entre um passo e outro, percebeu que transpôs o
limite.
Exatamente ali, naquele ponto.
Quase dava para ver no chão.
A linha.
Aquele limite imaginário, entre o que vale e o que não
vale a pena. Início ou final? O desconhecido. O limite da dúvida.
Entre seguir, parar ou voltar.
Tomado de surpresa, entende de imediato o fim da
jornada.
Desde que a iniciou, jovem ainda, sabia que um dia a
caminhada teria fim.
Mas saber é uma coisa, sentir isso é outra. E bem
diferente!
As coisas só têm peso quando vividas, fora isso são
meras especulações.
E esse tipo de coisas, quando vividas, também têm
gosto, e normalmente é amargo...
Também sabia que a estrada continuaria eternamente,
apenas a sua presença não mais estaria lá.
Descobriu neste meio tempo que andava em círculos.
Que tudo era apenas uma farsa.
Procurar pelo que não existe.
Dar sentido ao que tem sentido algum...
Mas continuou a andar. Era necessário.
Mas agora, naquele momento, veio a primeira certeza.
Tudo ficou claro.
O próximo passo será o da liberdade.
Num último esforço ergueu mais uma vez a perna e a
lançou à frente.
Sentiu o movimento, mas percebeu que seu corpo não
movia um milímetro.
Olhou ainda para trás, e antes que a bruma repentina
encobrisse totalmente sua visão, viu que seu corpo, velho e carcomido, coberto
de cicatrizes, faltando pedaços, ficara para trás.
Aceitou que o envelhecimento, as feridas cicatrizadas
e os pedaços que se perderam no caminho foram o pagamento por tê-lo
corajosamente trazido até aqui. E agradeceu por isso.
Fechou os olhos para eternizar essa imagem, sabia que
jamais a veria de novo.
À frente, novo horizonte.
Ao longe, imaginou que existirão verdes montanhas,
lagos, rios e mares de água limpa e cristalina.
E pássaros e girassóis, e música, e livros e poesia. E
seres formados de energia pura limpa e perfeita.
Mesmo que a neblina não o deixasse enxergar um metro
adiante do seu nariz, acreditou que estarão lá.
Falou em voz alta, tenho que viver isso.
Apressou o passo, o tempo pode ser curto, pensou.
Marco Rodrigues consegue unir o
exato e o divagar do pensar. Engenheiro elétrico e filósofo, pai de muitos
filhos e, por óbvio, homem de muitos amores. Amores profundos, serenos e
filiais. Empreendedor num mundo de risco e perspicaz no risco das letras.
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