Cincopes

on 04 junho 2025

POLÍTICA - INFLAÇÃO DE DEMANDA

Em 1998, fiz um curso sobre gestão em que um dos professores era um japonês, consultor de uma entidade similar ao Sebrae, no Japão.

Ele surpreendeu a plateia com uma visão de futuro de longo prazo (30 anos), onde via um Brasil marcando passo no seu desenvolvimento e mínimos avanços na desigualdade social, se não mudasse sua política industrial. Ele mostrou com números, que a capacidade industrial brasileira e o mercado de serviços estavam dimensionados para atender apenas 15% da população. A estrutura não disponibiliza produtos duráveis ou com valor agregado de qualquer linha a grande parte da população porque o mercado desenhou um sistema que não sobrevive sem oligopólio. E o cenário se repete no setor de serviços.

A chamada "inflação de demanda", na verdade é uma política de mercado para ter altos lucros com mercado cativo. Na época, eu não tinha percepção clara, vivíamos embalados pelo sucesso do Plano Real e achei que o tempo derrubaria a tese do japonês.

Hoje, quase 30 anos depois, vejo a mesma ladainha “não podemos crescer, porque o sistema não aguenta”, mas é hora de darmos um basta e criarmos uma política que inclua mais brasileiros. Vivemos o maior Nível de Utilização de Capacidade Instalada da Indústria (NUCI) , 83,7% em 14 anos e o cenário é de incerteza. Não pode aumentar salário porque se a população for às comprar, o mercado não consegue atender.

Analisando o cenário, se com um nível de quase 84% temos esse problema, devemos supor que nem com 100% o drama se resolve. Mesmo com renda, o brasileiro está proibido de consumir.

A renda média cresceu, mas ainda é baixa pelo arrocho salarial histórico. Por mais que um ou outro governo invista no crescimento da renda e na recomposição salarial, há muito a recuperar. Basta ver a cesta básica mínima que serviu de parâmetro para o primeiro salário-mínimo da história e comparar com a de hoje e o valor do salário atual.

O tempo tem mostrado que o Brasil aguenta um PIB anual em torno de 3%, como 2023 e 2024. Em 2025, a previsão deve se repetir e “surpreender” o mercado. E vamos continuar sobrevivendo.

No cenário macroeconômico, estamos razoavelmente estáveis. A relação dívida-PIB está estável, a inflação tem tendência de queda, as reservas estão altas, os juros não têm espaço para crescer, a massa salarial e o salário médio crescem, o número de estudantes no ensino superior aumenta e cada vez mais novos consumidores entram no mercado.

Nosso problema está na microeconomia e na política.

Apesar das manchetes sobre polarização, ela não existe, porque o debate não é ideológico. O radicalismo e o fisiologismo são os responsáveis pela paralisia do país. Nada se faz sem passar no caixa. Nossos políticos se comprometem com o poder para conseguir recursos para fazer promessas ao eleitor. Eleitos, se dobram a quem financia sua eleição e atende seus interesses.

E a esses não interessa participar com sua parte no esforço para reformas estruturais, basta ver a farra na definição de isenções e alíquotas do IVA.

Às favas, o eleitor e o país!

O Brasil precisa que a elite e os políticos não se incomodem em dividir o país com o restante da população.

A solução do problema é cidadania, respeito ao outro e pensar em soluções estruturantes e de longo prazo. O problema não é de esquerda, direita, ideologia ou filosofia, é estrutural onde o dinheiro tem comprado o poder e aliciado governos.

Vendemos o almoço pra pagar a janta, Só que todo mundo vende e na hora de chamar à mesa, poucos jantam.

Se não voltarmos a fazer política como função social e democrática, seremos um país sem futuro, à mercê de aventureiros, oportunistas e apátridas.