“O revolucionário mais radical se torna um conservador no dia seguinte à revolução", Hannah Arendt
Pela
primeira vez, um candidato a presidente consegue reunir um espectro tão grande
de ideologias e interesses numa Frente Ampla nacional.
Lula
foi a figura central, mas houve nomes que foram extremamente importantes na sua
montagem e na vitória como Alckmin, Tebet, Haddad, Janones, Janja, Marina,
Randolfe, Kassab, Boulos, o grupo Liberal Livre e outros.
Essa
mobilização surgiu porque o país jamais havia sentido a real necessidade de
união política, mesmo que temporária. Houve a tentativa de JK, Carlos Lacerda e
João Goulart, em 1966, abatida em voo pela ditadura. E, talvez, possamos
considerar a eleição de Tancredo, em 1985, mas dentro de um colégio eleitoral,
sem as ruas.
Nos
últimos quatro anos, o governo federal desestruturou a rede de amparo social,
plantou bombas de tempo na área econômica, quebrou o caixa do país, recuou
trinta anos nos costumes, abriu fissuras nas famílias, incentivou o submundo a
se organizar, armou o crime, entregou as fronteiras e a Amazônia ao tráfico de
drogas, armas e à biopirataria, esgarçou o tecido social no limite da ruptura, desprezou
a educação, apequenou a ciência, abandonou a saúde, desconstruiu o prestígio
das FFAA duramente reconquistado e, por necessidade de se sustentar no cargo, abriu
mão de governar e transferiu um poder descomunal ao Congresso, mais
precisamente ao Centrão.
A
vitória de Lula coloca em cheque as campanhas digitais. Em 2018, o capitão
surfou na onda e surpreendeu. Em 2022, continuou sendo melhor, mas não o
bastante. Por medo da reação e violência bolsonarista, o PT demorou a ir às ruas,
mas foi onde conseguiu tirar a diferença. O medo que a extrema-direita tem de
Lula (vide 2018) se justificou e, se fosse outro o candidato, o resultado poderia
ser outro.
A
montagem do governo é um teste para medir o pragmatismo do PT, o apetite dos
parceiros, o poder de pressão das bases, o fisiologismo do centrão, a ambição
dos aliados e a capacidade de Lula para acomodar tudo isso num governo com uma
dívida enorme com a sociedade.
O
mercado também está dividido entre empresas estruturadas e com background
internacional e aquelas que precisam da proteção e caixa do governo, seja em
recursos ou legislação.
E
os nomes anunciados agora, não resistirão a todo o mandato. Conforme o andar,
as melancias se ajeitarão, algumas se jogando, outras caindo ou sendo jogadas da
carroça. Lula tem na mão o poder e a confiança da população para reconduzir o
país aos trilhos da democracia e paz social, escrevendo seu nome na história. É
um desafio enorme, mas não vejo outro nome com capacidade de catalisar e
administrar esses interesses diversos, difusos e poderosos. Pode pagar caro se
errar, porque não terá tempo e, talvez, nem uma reeleição para se recuperar.
A
mudança na lei diminuindo a quarentena (deixou de existir), a conquista voto a
voto para aprovar a PEC, a articulação com o STF, a diminuição do campo de
manobra de Lira, a ponte com o Senado e a mobilização de algumas lideranças
mostrou que Lula vai ter que negociar muito. Os fisiologistas não se renderão
barato.
Lula
poderia ser mais inflexível, mas a herança do centrão e do capitão deixaram o
país na berlinda e diminuíram o poder de barganha do novo governo. Em outro
cenário, os parlamentares e os partidos não teriam tanta capacidade de impor
condições.
E
não adianta reclamar, porque quem elegeu o Congresso foi o povo usando a mesma
ferramenta que elegeu o executivo, a urna eletrônica.
Se
houve fraude, por que não manipularam também os proporcionais para dar maioria
ao Lula?
Fraude?
Só delirantes acreditam nessa patacoada.
Lula
entendeu que o capitão não tinha senso político e nem ideologia, baseava seu
discurso no egocentrismo e em pontos que movimentam uma minoria ruidosa da
população. O discurso religioso, o medo irreal da classe média, o machismo
bélico, as viúvas da ditadura e estratos da sociedade que se aproveitam do
estado para impor suas regras e levar vantagens acabaram seguindo o mito.
Lula
venceu usando a política e vai precisar dela pra governar. E política é a arte
de ir e vir, ceder, negociar, impor e decidir.
Bora,
torcer e fiscalizar para que a justiça e o bom senso preponderem no próximo
governo.
x
Emoticon Emoticon