A
Lucidez da Loucura
No Brasil, as manchetes e os fatos cotidianos
surreais precisam ser analisados por psicanalistas e não por comentaristas e
cientistas políticos.
Em junho de 2013, os brasileiros saíram da
frente das telinhas e se tornaram notícia, fazendo da rua seu cenário. Houve muita
perplexidade, grandes repercussões midiáticas e poucas atitudes. Na resposta
dos políticos, mais explicações que resultados.
A prova de que mobilizações populares não levam nossa classe
política à reflexão é que nos últimos dez anos, 528 proposições que têm a
corrupção como tema tramitam no Congresso sem resultado prático. A maioria e as
que tramitam com mais rapidez, são aquelas que criam dificuldades às
investigações ou mecanismos que abrandam punições.
Os cartazes de 2013 pediam mudanças políticas
no Brasil e anunciavam ser contra os políticos e os partidos, da
extrema-direita à extrema-esquerda. Eram contra a política praticada no país, distante
do povo, longe dos interesses da sociedade e afastada das ruas. A versão
brasileira está plenamente integrada ao jogo de interesses, tráfico de
influências, corporativismo, poder econômico, corrupção e fisiologia, passando
longe da verdadeira política.
O perfil das pessoas nas ruas, quase 60% de
nível universitário, reconhecia que a única saída era a participação.
Chegou setembro e a festa da Independência
motivou novas manifestações. Muitos temas não voltaram às ruas e os grupos
foram mais definidos e organizados. Os principais alvos foram os governadores e
os prefeitos de algumas capitais. Dessa vez, faltou povo, porque os movimentos
de junho refluíram sem tomar os espaços de decisão, pressão e fiscalização.
A incompetência do governo e a Operação
Lava-Jato permitiram uma orquestração competente que a partir de 2014 transformou
as manifestações em um movimento antigovernista e não contra a corrupção.
E veio o impeachment... E não veio a luz no
fim do túnel e nem as soluções. Apenas incerteza e mais do mesmo ou pior.
As transformações sociais ocorridas no
Brasil, principalmente a partir do Plano Real, não surtem efeito porque nossas
estruturas são anacrônicas e ultrapassadas, nos fazendo um país de paradoxos,
insanidades e anomia perplexa.
O surgimento de partidos sem fundamento ideológico,
a reforma política que não avança, a justiça legal e injusta, os governos
penalizando o contribuinte e os recursos públicos distribuídos fisiologicamente
são alguns dos problemas.
Absolvições, manobras protelatórias e
chicanas legais não são obras desse ou daquele partido, mas são posicionamentos
da classe política, prepotente e arrogante. Em todos os níveis diretivos do
país, do municipal ao federal, desapareceu a negociação programática.
Em cada pleito, elegemos um executivo, mas só
conhecemos o governo após as “negociações” entre aliados e adesistas. Qualquer
que seja o vencedor, ele precisa abandonar seu discurso diante da necessidade
de apoio do conservadorismo político que detêm o verdadeiro poder e está
incrustado na máquina estatal desde o final dos anos 50 do século passado. Elegemos
uma proposta e no dia da posse a realidade cai sobre nossas cabeças.
Também nos falta uma oposição política
organizada, e esta, provavelmente virá das ruas. A tendência é que as
manifestações radicalizem em alguns focos, mas sem fugir da exigência de uma
mudança estrutural verdadeira.
A indignação popular é o novo fator de
importância que os políticos têm que colocar na balança. Basta de políticos que
precisam da política. É hora dos políticos que fazem política para aqueles que dela
precisam.
Há opiniões diferentes sobre as manifestações
e eu ouso dizer que todas estão certas. São percepções pessoais fruto de
ideologia, vivência pessoal, círculo social e outras formas de indução ao
pensamento crítico, mas a realidade é uma só.
Basta de uma classe política
insana que zomba da nossa sanidade. Aristóteles dizia que as pessoas se guiam
pela dor e pelo prazer. Talvez esteja doendo demais.
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